Matadouro-Cinco, de Kurt Vonnegut, 1969

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Matadouro-Cinco, Kurt Vonnegut, 1969, 288 páginas, tradução de Daniel Pellizzari, Intrínseca. Releitura. Início: 03/03/2021 – Fim: 09/03/2021. Nota 2 (Regular).

Um livro que vai fazer as pessoas detestarem a guerra, define o autor no começo. Não é. Ele quis dizer: um livro que não glamorizasse a guerra. Ora, todas as pessoas comuns detestam a guerra, mas muitos gostam de ler livros sobre guerra, conhecer as atrocidades, o pior da humanidade, as estratégias, os motivos. Políticos e soldados adoram a guerra, evidentemente. O livro não faz detestar a guerra, como queria o autor e, pior, faz a guerra parecer algo leve.

O personagem é um boboca, ou maluco. Billy Pilgrim atravessa a guerra como um bobo da corte ou um alienado.

Há três ou quatro arremedos de histórias sendo contadas e nenhuma delas resulta. A história do próprio autor, a história de Billy durante a guerra, a história de Billy pós-guerra como optometrista de sucesso e pai de família, e a história de Billy no planeta Tralfamadore, para onde foi levado por alienígenas e exposto em um zoológico. Billy se julga um viajante do tempo: ele pode acessar qualquer período de sua vida a qualquer instante. Nenhuma dessas tramas tem desfecho satisfatório. A expressão “é assim mesmo” que o autor repete a cada parágrafo torna o livro ainda mais tedioso.

Tudo é episódico, sem conclusão, sem sequência. O leitor não vai saber o que acontece com Billy e Montana no zoológico de Tralfamadore; não vai saber como foi a viagem do autor com Bernard a Dresden, muitos anos depois da guerra. Nada tem conclusão. A descrição dos dias em Dresden é solta, fragmentada. Todas essas histórias dariam um bom livro; os pedaços delas, reunidos aqui, não conformam um romance de qualidade.

É incompreensível o motivo pelo qual este livro se tornou tão famoso.

Resumo:

Capítulo 1. O amigo do narrador, Bernard O’Hare, que esteve na Segunda Guerra com ele, é promotor público. O narrador visita Bernard e combinam de ir juntos à Europa. O avião para Frankfurt, com Bernard, não pousou em Boston e o narrador só embarca no dia seguinte. Aproveita para ler sobre Cèline e Sodoma e Gomorra.

Capítulo 2. Billy Pilgrim, solto no tempo, pula para qualquer ano de sua vida, 1955, 1941, 1963. Billy nasceu em 1922, teve um colapso antes de casar, sofreu um acidente de avião do qual foi o único sobrevivente, a esposa morreu por inalação de monóxido de carbono (suicídio?). Billy divulga que, em 1967, um disco voador do planeta Tralfamadore o levou para ser exibido em um zoológico. Passado, presente e futuro coexistem. A filha Barbara pensa que Billy está senil aos 46 anos, devido ao acidente de avião. Em 1944, Billy é assistente de capelão no exército. Enviado para o front, fica vagando confuso. É ajudado pelo soldado Weary, de 18 anos. Billy solto no tempo pela primeira vez, volta ao momento em que a mãe foi internada em um asilo e perguntou: “Como eu fiquei tão velha?”.  Pula para anos diversos, 1965, 1958, 1961.

Capítulo 3. Billy e Weary são aprisionados pelos alemães. Billy vai para 1967, em seu consultório. Vai para uma reunião do Lions. Era rico e chorava sem motivo. Na guerra, vê fogos de santelmo em torno das cabeças dos outros prisioneiros. Caminhada dos prisioneiros, inverno. Trem de prisioneiros, no vagão, dezembro de 1944. Viaja para 1967.

Capítulo 4. Casamento da filha. Chega o disco voador de Tralfamadore, 30 metros de diâmetro. No vagão do trem. Weary morreu. Chegam ao campo de prisioneiros. Conhece Edgar Derby e Paul Lazzaro. No disco voador, o tralfamadoriano diz que somente no planeta Terra se fala em livre arbítrio.

Capítulo 5. Conhece os livros de Tralfamadore. Com 12 anos, no Grand Canyon, com os pais. Na guerra, são recebidos nos barracões dos prisioneiros ingleses, os ingleses são limpos e organizados; comida e peça de teatro. Billy tem um surto e lhe aplicam morfina. Pula para o hospital de veteranos em 1948, pensam que Billy está ficando louco. No hospital, conhece Eliot Rosewater que lhe apresenta à ficção científica de Kilgore Trout. Visitas da mãe de Billy. Visita da noiva, Valencia, gorda, feia e rica. Crítica: na ficção científica de “Trout”, os terráqueos são norte-americanos. Pula para o zoológico em Tralfamadore, Billy tem 44 anos, vive nu sob uma cúpula de vidro. Os tralfamadorianos sabem como e quando o universo vai acabar: um piloto deles comete um erro e o universo explode. Lua de mel com Valencia. Com a filha, depois da morte da esposa. No zoológico, com Montana, atriz de vinte anos que foi levada para Tralfamadore.

Capítulo 6. No campo de prisioneiros, Paul Lazzaro jura que vai matar Billy depois da guerra. O motivo é fútil: Weary acusou Billy, incorretamente, de ser o responsável por sua morte. Billy já viu a própria morte, a mando de Lazzaro, em 1976. Os Estados Unidos foram balcanizados e se compõem de vinte nações; em Chicago, Billy faz um discurso sobre discos voadores e Tralfamadore e é morto a tiros. Billy chega a Dresden, cidade aberta e encantadora. Os prisioneiros ficam no Matadouro-Cinco.

Capítulo 7. Cai o avião em que Billy viajava, ele sobrevive com fratura no crânio. No matadouro, Billy contempla trinta moças alemãs refugiadas que tomavam banho. Os prisioneiros trabalham em Dresden.

Capítulo 8. “Esta história quase não tem personagens nem confrontos dramáticos. Billy conhece Kilgore Trout em sua cidade, em 1964; entregam jornais juntos. Aniversário de casamento e Billy se sente mal ao ouvir um quarteto de cantores porque se recorda de quatro guardas após o bombardeio de Dresden. O bombardeio. Quatro guardas e cem prisioneiros se abrigam no frigorífico e se salvam. No zoo, Montana está grávida de seis meses. No dia seguinte ao bombardeio, aviões atiram nos sobreviventes. Os guardas e os prisioneiros caminham para o subúrbio e se abrigam em uma pousada.

Capítulo 9. Valencia foi ao hospital para ver Billy após o acidente de avião; carro sem escapamento e ela morre envenenada por monóxido de carbono. Billy indiferente no hospital. Billy no matadouro, pós bombardeio, em uma carroça ao sol. Feliz com o dia de sol. Chora quando descobre que os cavalos estavam feridos. Depois da guerra, tem crises de choro. Volta para casa de navio. Depois do acidente de avião, Billy fugiu de casa para Nova York. Em uma livraria, encontra livros de Trout sobre o planeta Zircon e sobre uma viagem no tempo para ver Jesus; encontra filmes pornôs de Montana. Billy é expulso de uma rádio ao falar da sua viagem espacial. No zoo, Montana dá de mamar ao filho deles.

Capítulo 10. O narrador fala superficialmente de sua própria viagem a Dresden com o amigo Bernard. Depois do bombardeio, Billy trabalha escavando minas de cadáveres. Os alemães queimam os corpos com lança-chamas. Edgar Derby é fuzilado porque pegou um bule de uma casa. Os prisioneiros são trancados no estábulo da pousada. Certo dia, são libertados, a guerra acabou.

Trechos:

Tarde da noite tem essa doença que me ataca vez ou outra, envolvendo álcool e telefone. Eu encho a cara e afasto minha esposa com um hálito de gás de mostarda e rosas. Em seguida, falando com pompa e elegância ao telefone, peço que as operadoras me conectem com esse ou aquele amigo do qual passei anos sem ouvir falar.

Esta história quase não tem personagens nem confrontos dramáticos, pois a maioria das pessoas que aparecem nela está muito abatida e não passa de joguete de forças descomunais.